segunda-feira, 28 de março de 2016

…:: O mistério da síndrome de Camaçari ::…

Como o país descobriu que tinha zika.

  • O virologista Gúbio Soares Campos trabalha no Laboratório de Virologia da UFBA
    O virologista Gúbio Soares Campos trabalha no Laboratório de Virologia da UFBA
No começo do ano passado, uma doença misteriosa começou a chamar a atenção em um hospital de Camaçari, na Bahia. Ainda não sabiam que se tratava da zika, e a doença ganhou o apelido de “síndrome de Camaçari”. “O diretor do hospital [Santa Helena, que registrava casos da “doença misteriosa”] me chamou para tentar esclarecer o caso. Achavam que era a água que contaminava as pessoas. Quando fui lá, percebi que não era a água e disse que era doença nova, que tínhamos que tentar descobrir, diz o médico infectologista Antonio Carlos Bandeira.
“Todos estavam procurando algum vírus diferente e não estavam encontrando. Eu suspeitava que era arbovirose, então enviei as amostras para o Gúbio [Soares Campos, coordenador do Laboratório de Virologia da UFBA (Universidade Federal da Bahia)] e pedi para ele concentrar as buscas em um arbovírus [vírus transmitidos por insetos]”.
Os testes em laboratório começaram a ser feitos em fevereiro de 2015, quando a Secretaria de Saúde da Bahia foi notificada pelas unidades sobre casos de “doença exantemática indeterminada” (doenças que incluem manifestações na pele, mas sem diagnóstico).
A doença misteriosa fazia com que pacientes apresentassem manchas no corpo, febre e coceira. Pelas características, os pesquisadores já acreditavam se tratar de uma doença que fosse transmitida por um inseto. Então, os pesquisadores da UFBA começaram a fazer testes para doenças pouco conhecidas no Brasil.

Mayaro? Febre do Nilo Ocidental? Não, Zika!

Foram feitos testes inicialmente para doenças como Febre de Mayaro e Febre do Nilo Ocidental. Na época, eles acreditavam que era mais provável que essas doenças tivessem chegado ao país. O vírus da zika foi o último a ser testado. “Nós testamos cinco arbovírus: mayaro, vírus do Nilo ocidental e outros três que não recordo o nome. Pegamos o material e testamos para todos que tinham um quadro clínico parecido. Então, como foi dando negativo, íamos excluindo, e só nos restava o vírus da zika”, diz Gúbio Soares Campos.
No dia 28 de abril de 2015, pela primeira vez no país, os pesquisadores confirmaram a infecção de pessoas pelo vírus da zika no país. Nos testes, oito das 24 amostras de pacientes de Camaçari deram positivas para a doença. “Vimos que o quadro clínico estava compatível com o que estava na literatura”, diz Campos.
“A gente não imaginava isso, porque não tinha relato. Não tinha nada escrito sobre zika na literatura, era pouquíssima coisa”, diz Bandeira. “A gente até ficou preocupado porque na Polinésia Francesa havia relatos de aumentar casos da síndrome de Guillain-Barré“, completa.
O infectologista diz que não há certeza de que o vírus da zika chegou ao Brasil pela Bahia. “Tivemos e temos muitas hipóteses em relação à chegada da zika, sabemos que tivemos ao mesmo tempo casos aqui, em Pernambuco, Rio Grande Norte e Paraíba. Já tínhamos relatos de casos com sintomas similares no final de 2014, mas são conjecturas, não há comprovação”.
De lá para cá muita coisa mudou no conhecimento do vírus. Sabe-se que ele pode ser encontrado na saliva, sêmen e urina e atravessa a placenta na gestação.
Agora, a luta de Gúbio Soares Campos e sua equipe é conhecer melhor o vírus da zika. “Estamos estudando a genética do vírus, a característica dele, como é a resposta imune. Queremos saber se uma pessoa que teve a doença poderá contrair de novo. Mas ainda falta muito trabalho, é muito cedo”, diz.


Fonte: Carlos Madeiro. Colaboração para o UOL, em Maceió.

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